Almas

20190409

amo-te 24

enquanto penso nisto a água vem e parte-me
enquanto durmo, o peso. é. leve. e sai-me.
é escuro em redor mas a luz é tanta
tanta estrada, tanto carro, tanto antro.
encontro-me numa casa de madeira e alfazema.
num passado qualquer dirias que o unto do fogo é fumo preto
que fica gravado no ar como um feitiço que se desdobra em pergaminho
e se lê entre vocês - bruxas.
[cheira a incenso]
e as velas que ardem limpam a alma e secam o chão
de entre os fundos do mar eu tento oferecer-te a merenda
[todas as noites].
de entre o tempo que há [nada].
dentro do tempo cá nada.
sobra nada. [só] capital.
e lá em baixo há putas.

já não escrevo. há muito, que não escrevo.
[custa tanto] - i mean, manter o foco.
[...]
e é de manhã. na verdade já passou o almoço e eu aqui.
é meio da tarde e entre os vazios da invisibilidade arrisco-me. 
escrever para ti, para chegar a ti. 
como uma manobra de diversão quando não te posso beijar.
ligo-te ao almoço ou não te ligo ao almoço? [fingir que cresci]
porra - dói-me a cabeça porque a água se colapsou.
fodeu-me as paredes e rasgou-me os olhos.
ás vezes tento fingir que morri.
ás vezes tento não gostar de ti
[minto].
[divago].
[desisto].
minto, divago, sinto

divago, mas pelo menos des-abafo.
perdi o jeito. vários, acho. e penso.
não sei se precisas de apoio ou se preciso de apoio
ou se nos apoiamos um no outro sem dar conta de onde vamos
a fingir que vamos sozinhos.
enquanto loucos nos achamos livres.
é quase final do dia. não termino por aqui porque "me continuas"
mas são seis da tarde e há tanto por fazer.
não quero escrever mais, mas nem disse o que queria
então, tempo é correr para te ver e ter um brinde para te organizar.
tu não sabes, ainda.
são seis da tarde e já sei que não vou fazer tudo o que queria
mas vou levantar daqui e comprar-te a merenda.
esperar por logo para te dar uma prenda e olhar-te nos olhos mais uma vez
e mais um dia, que é mais um ano.

que gigantes efémeros ficaram no tempo, lembras-te?
-se já passamos por tanto.
é que na paisagem de montedor agarramos a luta e vencemos o vento
e nos fizemos amor, e fodemos com amor e fazemos amor agora, no betão da cidade.
se crescemos juntos, amamos em separado
mas cada cantinho de ti é uma bênção que guardo ao meu lado
e cada suspiro [sigh] é um vestido que se rompeu
por já não te servir mais.
cresceste, e ao teu lado olho para cima e aprecio-te a sombra
proteges-me quando me queimo e abraças-me quando me afogo.
parabéns porque eu já não sei escrever
mas ainda sei escrever para registar o dia.
vou levantar o cú daqui a minutos 
e vou para ti.
e a ti, d'onde eu ande. por mais um ano.
por mais vida.
amo-te.